Lisboa, Agosto de 2020
A pandemia trouxe uma convulsão do consumo. Como em tantos outros imbróglios contemporâneos sobre os quais nos sentimos impotentes, sobrou-nos consumir. Comprar mantimentos para uma quarentena inédita, desesperar pela falta de equipamento de proteção ou participar em campanhas de angariação de fundos para a aquisição de ventiladores. A breve, mas impactante, disrupção nas cadeias globais de produção e distribuição relembrou a humanidade de que as coisas têm de ser feitas, manuseadas e transportadas, antes de poderem ser consumidas. A nossa consciência foi novamente infectada pela dependência humana da prática e da matéria. Não chega desejar, querer ou achar. Algures na situação mais extrema, perante a tirania da existência física, a nossa opinião sobre as coisas simplesmente não importa. Aí vai morrer o pensamento mágico que despreza o corpo das mercadorias, a sua origem profunda. O mesmo pensamento que deixou os oceanos imundos, cobertos de plástico que não pode ser “desfeito”.
